Escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária

Na literatura brasileira, muitos autores, em diferentes gêneros, exploraram o carnaval, essa festa que faz do Brasil o centro das atenções. Ao encerrar o segundo feriado de carnaval consecutivo sem desfiles e festas de rua, devido a pandemia da covid-19, apresentamos algumas obras que tem o carnaval como pano de fundo.

O mais interessante quando se pensa o carnaval na literatura, seja ela ficcional ou documental, é o caráter dúbio do carnaval, ao mesmo tempo alegre e depressivo, expansivo e introspectivo. Mostra, enfim, sua natureza radicalmente humana.

Apresentamos a seguir cinco obras – três romances e dois livros historiográficos – que têm a maior festa popular do Brasil como eixo central.

O país do carnaval, de Jorge Amado

Capa do livro O país do carnaval de Jorge Amado
Capa do livro

Talvez a mais famosa obra de Jorge Amado, Dona flor e seus dois maridos, tem uma cena capital que se passa em um domingo de carnaval. É neste dia, não à toa, que Vadinho morre, de súbito, vestido de baiana e em meio a um bloco de rua.

Em O país do carnaval, Jorge Amado fala sobre as contradições de um país reconhecido por sua festa popular, mas que, ao mesmo tempo, é também um lugar de sombras e introspecção.

Sinopse: romance de estreia, escrito quando Jorge Amado tinha dezoito anos, O país do Carnaval (1931) é, apesar do título irônico, mais sombrio e introspectivo que a maioria dos livros que fizeram dele o ficcionista mais popular da literatura brasileira. A narrativa começa no navio que traz de volta ao Brasil o jovem filho de fazendeiro Paulo Rigger, depois de sete anos em Paris, onde cursara direito e absorvera comportamentos e ideias modernas. Nos primeiros dias que passa no Rio de Janeiro, Rigger tenta compreender um país onde já não se sente em casa, um país que tenta timidamente superar seu atraso oligárquico e ingressar na era industrial e urbana. De volta a Salvador, ele participa de um grupo de poetas fracassados e jornalistas corruptos que giram em torno do cético Pedro Ticiano, cronista veterano. Todos se sentem insatisfeitos e buscam um sentido para a existência: no amor, no dinheiro, na política, na vida burguesa ou na religião. Nesse romance de geração, as dúvidas e angústias dos personagens espelham a situação do país, que naquele momento passava pela Revolução de 30 e procurava redefinir seus rumos.

A Lua Triste Descamba, de Nei Lopes

Capa do livro Lua triste decamba, de Nei Lopes
Capa do livro

Ambientado na primeira metade do século XX, o romance A lua triste descamba, de Nei Lopes, tem como protagonistas moradores do subúrbio carioca.

Esse duplo decentramento, social e geográfico, traz ao livro aspectos importantes da vida de uma cidade, que apesar de ser, à época, capital nacional, precisava conviver com o crescimento demográfico.

Neste contexto, o carnaval sempre foi, e ainda é, um espaço e um tempo de certos apagamentos das fronteiras sociais, mas também de gênero e de classe que marcam a sociabilidade brasileira.

Sinopse: o samba e o subúrbio carioca são as principais personagens do romance A Lua triste descamba. Nei Lopes procurou retratar nos diálogos – com êxito – a linguagem comum, do dia a dia, de pessoas reais: linguagem falada coloquial, que pode ser diferente da escrita formal, sem por isso estar errada. É a fala de cariocas da primeira metade do século 20, moradores dos subúrbios, frequentemente iletrados ou com baixa escolaridade. Com seu vocabulário regional, sua pronúncia típica, suas construções de frase usuais. Nanal, Isaura, Arnô, Lelinho e Vanda serão alguns dos mestres de cerimônia nessa viagem ao coração da Cidade Maravilhosa e as interferências e transformações que o urbanismo produziu no cotidiano social carioca daquela época. Mais do que simples entretenimento e memória da cidade, A Lua triste descamba é um registro, com valor sociológico, da linguagem usada no tempo, lugar e contexto social onde se passa a história. Cabe ao leitor se colocar na pele dos personagens, escutar e entender seu falar tão rico e saboroso.

Carnaval, de Manuel Bandeira

Capa do livro Carnaval de Manuel Bandeira
Capa do livro

O livro de poemas Carnaval, de Manuel Bandeira, foi sua segunda obra publicada dois anos depois de A Cinza das Horas, de 1917. O último verso do livro denota a melancolia que marca os 32 poemas que compõem a coletânea: “o meu carnaval sem nenhuma alegria”.

Sinopse: publicado em 1919, Carnaval nos apresenta um Manuel Bandeira polêmico e desafiador, principalmente pelo poema “Os sapos”, que mobilizou as lutas modernistas do início do século XX e se tornou ícone da rebeldia da Semana de 22. E muitos recados subliminares que mudaram profundamente os rumos da poesia brasileira também constam nesta obra.

Uma história do samba, de Lira Neto

Capa do Livro história do samba de Lira Neto
Capa do livro

Reconhecido biógrafo, Lira Neto aborda no primeiro volume desta obra, dividida em três tomos, a história que vai do surgimento do samba ao primeiro desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro.

Ainda devem ser lançados outros dois livros para completar a trilogia do samba. Estas historiografias são documentos importantes e fundamentais para quem deseja, por exemplo, ambientar um conto ou romance a partir de fatos da história dessa música originária dos povos afro-brasileros.

Sinopse: Lira Neto se lançou ao desafio de contar a história do samba urbano. Em sua nova empreitada, o escritor cearense pretende retraçar, com sua verve narrativa singular, o percurso completo desse ritmo sincopado que é um dos sinônimos da brasilidade. Em virtude da riqueza e da amplitude do material compilado, recheado de documentos inéditos e registros fotográficos, o projeto será desdobrado em três volumes – neste primeiro, Lira leva o leitor das origens do samba até o desfile inicial das escolas de samba no Rio. O samba carioca nasceu no início do século XX a partir da gradativa adaptação do samba rural do Recôncavo baiano ao ambiente urbano da então capital federal. Descendente das batidas afro-brasileiras, mas igualmente devedor da polca dançante, o gênero encontrou terreno fértil nos festejos do Carnaval de rua.

Dicionário da história social do samba, de Nei Lopes e Luiz Antonio Simas

Capa do livro Dicionário da história social do samba de Nei Lopes e Luiz Antonio Simas
Capa do livro

Reconhecido com o galardão do Jabuti de Não Ficcção, Dicionário da história social do samba, de Nei Lopes e Luiz Antonio Simas, joga luz sobre a cultura marginalizada do samba no começo do século XX no Rio de Janeiro.

De preconceito estético a identidade cultural do Brasil, o samba tornou-se nossa mais comum e valiosa “poesia de exportação”, como sonhavam modernistas como Oswald de Andrade, muito embora sua intuição passasse longe do samba.

Sinopse: Expressão da cultura marginal carioca do início do século XX, o samba resistiu a décadas de racismo e preconceito estético, e se tornou parte inextrincável da identidade nacional brasileira. Nesta obra de referência pioneira, Nei Lopes e Luiz Antonio Simas – grandes estudiosos do tema – inscrevem o valor da negritude e da história dos negros na criação e na fixação do samba, e a ambígua inserção dessa cultura musical na sociedade de consumo. Mais do que apenas descrever conceitos, neste importante dicionário autores reconstroem a memória cultural de nosso país.

Clube de criação literária

Clube de Criação Literária é uma dessas ações de mecenato coletivo – neste caso, em favor do escritor e tradutor Robertson Frizero. Mas, como o próprio nome sugere, é uma ação de mecenato que traz, também, uma ideia inovadora no campo da formação continuada em Escrita Criativa.

Associando-se ao Clube, o participante colabora com o mecenato coletivo e tem acesso a conteúdo exclusivo sobre Criação Literária:

  • Material didáticoartigos resenhas de livros de interesse na área de Criação Literária;
  • Reuniões on-line e debates sobre Criação LiteráriaLiteratura Mercado Editorial;
  • Vídeos, áudios, apresentações e sessões de mentoria literária em grupo;
  • Sorteios mensais de livros e serviços de mentoria literária individual e leitura crítica.

Leia também

Prêmio Açorianos de Literatura divulga os vencedores da edição 2021

Semana de Arte Moderna de 1922: o modernismo e os modernismos

Como escrever livros infantis

Gabriel Garcia Marquez: cinco dicas de escrita criativa do Gabo

Dez adaptações de Shakespeare para o cinema

Literatura e entretenimento na cultura pop infantil

Por que voltar a escrever?

A estrutura narrativa inversa em “O amigo fiel”, de Robertson Frizero

Robertson Frizero: meus 50 livros de cabeceira

Das ideias à forma: como superar o mito da inspiração

Concurso literário e antologias gigantescas: saiba como avaliar a seriedade dos certames

Tagged:
Roberson Frizero é escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária. É Mestre em Letras pela PUCRS e Especialista em Ensino e Aprendizagem de Línguas Estrangeiras pela UFRGS. Sua formação inclui bacharelado em Ciências Navais pela Escola Naval (RJ). Seu livro de estreia, Por que o Elvis Não Latiu?, foi agraciado pelo Prêmio CRESCER como um dos trinta melhores títulos infantis publicados no Brasil. Seu romance de estreia, Longe das Aldeias, foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, do Prêmio Açorianos de Literatura e escolhido melhor livro do ano pelo Prêmio Associação Gaúcha de Escritores – AGES. Foi, por três anos consecutivos, jurado do Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro – CBL.

Related Posts