Escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária

Literatura policial: Da inquietude ao senso de justiça. Entrevista com Carina Luft

Escritora conta como começou a escrever e da necessidade de se estar aberto a críticas para poder evoluir na escrita criativa

Se na arte a verossimilhança é fundamental e nada ocorre sem querer, sob pena de não convencer o leitor dos argumentos da trama, na vida real a coisa é um pouco menos rigorosa. E foi assim, quase sem querer, que Carina Luft se tornou escritora. “Há cerca de vinte anos, escrevi uma crônica para o Informativo, aqueles jornaizinhos corporativos, da empresa em que trabalhava, e os colegas começaram a me telefonar para dizer o quanto tinham gostado”, conta Carina em entrevista por e-mail. “Muitos deles ligaram para o Marketing, que era a área responsável pelo informativo empresarial, pedindo um espaço de escrita para mim, eles queriam outras crônicas, e isso aconteceu”, complementa.

Seu gênero literário predileto é a literatura policial, que lhe rendeu, entre outros textos em dezenas de antologias e indicações para prêmios, dois romances Fetiche (2010) e Verme (2014). Sobre o encantamento pela narrativa policial, Carina conta que “Vem do senso de justiça, da inquietação, da indignação diante do crime. É como se através desta literatura eu pudesse dizer ‘isso precisa mudar’, e, assim, conversar com o leitor, provocar algum tipo de reflexão social”, pondera.

Para quem deseja escrever e tornar-se escritor, Carina é enfática. “Leia, leia muito. Leia antes, leia depois. Estude. Conheça-se. Entenda seus desejos e aspirações. Defina-se. Aceite a crítica com humildade, só depois comece a escrever. Será, no mínimo, menos sofrido”, ensina.

Carina Luft é escritora, nascida na cidade de Montenegro, RS. É também assistente executiva bilíngue, especialista em administração de empresas e professora de inglês. Durante a sua trajetória literária, dedicou-se dezenas de projetos, dos quais destacamos os romances Fetiche (Porto Alegre: Dublinense, 2010) e Verme (Porto Alegre: Dublinense, 2014), obras que tiveram versões traduzidas na Alemanha, Suiça, Áustria e Croácia.

Foi Patrona da 13ª Feira do Livro de Montenegro e 9ª Feira do Livro do Vale do Caí, em 2015. Atualmente é curadora da antologia de contos policiais, organizada pela editora Entrecapas, de Curitiba, suja publicação está prevista para 2021.

Carina Luft - Em meio aos seus livros
Carina Luft (Arquivo pessoal)

Leia a entrevista na íntegra.

Robertson Frizero – O que é, para você, a literatura?

Carina Luft – Um meio de ver a vida com outros olhos, com a mente mais aberta. É, também, um meio de viajar, de relaxar e me desenvolver.

RF – Como você se tornou escritora?

Carina Luft – Há cerca de vinte anos, escrevi uma crônica para o Informativo, aqueles jornaizinhos corporativos, da empresa em que trabalhava, e os colegas começaram a me telefonar para dizer o quanto tinham gostado. Muitos deles ligaram para o Marketing, que era a área responsável pelo informativo empresarial, pedindo um espaço de escrita para mim, eles queriam outras crônicas, e isso aconteceu. Até que uma colega me perguntou se eu não pensava em desenvolver ou profissionalizar aquilo. De fato, não! Então ela me recomendou uma oficina literária e assim eu comecei. Posso dizer que ali eu comecei a escrever de verdade.

RF – Do que versam seus livros Fetiche (2011) e Verme (2014)? Que temas são abordados nas obras?

Carina Luft – Ambos são literatura do gênero policial ou subgênero noir. Fetiche, por ser mais investigativo e linear, é o típico romance policial onde traz todos os elementos básicos e necessários para o desenvolvimento da história:  crimes de assassinatos praticados por um serial killer fetichista. Verme, fala dos crimes de corrupção, ele traz outro tipo de abordagem onde é possível refletir sobre o impacto social e familiar de uma polícia corrupta.

RF – De onde vem o fascínio pela literatura policial?

Carina Luft – Vem do meu senso de justiça, da inquietação, da indignação diante do crime. É como se através desta literatura eu pudesse dizer “isso precisa mudar”, e, assim, conversar com o leitor, provocar algum tipo de reflexão social. Embora o gênero seja visto como uma literatura de entretenimento, para mim, ela vai além e pode ser tão profunda quanto qualquer outra. Também vem da curiosidade que todo mistério desperta. Pelo menos, em mim. É um jogo de sedução, uma disputa, talvez um quebra-cabeça que estimula o raciocínio lógico. Fico meio hipnotizada e costumo dizer “quero ver aonde isso vai, e o que motivou essa pessoa a fazer isso.”

RF – Que autores te inspiraram e te inspiram a escrever?

Carina Luft – Agatha Christie é sempre inspiradora, mas, sem dúvida existem outros autores que também me inspiraram, como Rubem Fonseca que fala da urbanidade através de uma linguagem áspera. Gosto da linguagem visceral e seca que os romances policiais trazem. Gosto também da genialidade de Conan Doyle e George Simenon. Já Leonardo Padura continua sendo uma grande fonte de inspiração até porque eu gostaria de fazer uma literatura como a dele. Sobre os que me inspiram a escrever? Todos os escritores que resistem bravamente ao preconceito que há nesse gênero. Às vezes, penso que o desafio de fazer boa literatura num meio conservador onde não há reconhecimento acadêmico para esse tipo de escrita, é o que mais me seduz. Gosto dessa subversão.

RF – Quais são os livros que mudaram sua vida?

Carina Luft – O Diário de Anne Frank foi impactante, até porque eu o li ainda adolescente e ele despertou, ou aflorou, o senso de justiça, de igualdade, de direitos e tudo que está vinculado a isso. Outro que me impactou muito, não chegou a mudar minha vida, mas me fez pensar foi O jardim de cimento, de Ian McEwan.

RF – O que não pode faltar em um bom conto policial?

Carina Luft – Mistério e suspense.

RF – Que dicas você daria a um aspirante a escritor ou mesmo a um escritor iniciante?

Carina Luft – Leia, leia muito. Leia antes, leia depois. Estude. Conheça-se. Entenda seus desejos e aspirações. Defina-se. Aceite a crítica com humildade, só depois comece a escrever. Será, no mínimo, menos sofrido.

RF – O que é a vida?

Carina Luft – Algo inexplicável, não há fórmula, nem roteiro, nem conceito. A vida é algo muito, muito maluco.


Livro Fetiche – Carina Luft

Capa livro Fetiche

Quando jovens aspirantes a modelo começam a aparecer mortas e seus pés, arrancados dos corpos, desaparecem, não resta mais dúvida de que não se trata de um assassino comum. Entre trapaças e mentiras, a trama leva o leitor para um mistério cheio de suspense, envolto em segredos e conduzido por um louco fetiche.

Livro Verme – Carina Luft

Capa livro Verme

Policiais, bicheiros, militares, políticos, prostitutas e até o reitor da universidade.Todos eles fazem parte do jogo de poder e corrupção que o delegado Fernão Weber enfrentou durante anos, dividido entre a justiça e o dinheiro fácil. Ele então resolve vomitar os podres e as angústias que o acompanharam nessa trajetória crua, passando pelo desmanche de carros e chegando a uma trama que envolve chantagem e assassinato entre banqueiros do jogo do bicho e seus comparsas.

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Roberson Frizero é escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária. É Mestre em Letras pela PUCRS e Especialista em Ensino e Aprendizagem de Línguas Estrangeiras pela UFRGS. Sua formação inclui bacharelado em Ciências Navais pela Escola Naval (RJ). Seu livro de estreia, Por que o Elvis Não Latiu?, foi agraciado pelo Prêmio CRESCER como um dos trinta melhores títulos infantis publicados no Brasil. Seu romance de estreia, Longe das Aldeias, foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, do Prêmio Açorianos de Literatura e escolhido melhor livro do ano pelo Prêmio Associação Gaúcha de Escritores – AGES. Foi, por três anos consecutivos, jurado do Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro – CBL.

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